JOE JONAS percebeu que sua governanta queria lhe dizer alguma coisa assim que ela chegou com sua sobremesa preferida.
– Pudim de pão? – perguntou ele, erguendo as sobrancelhas.
– Mas eu nunca como sobremesa no almoço, a menos que seja uma ocasião especial.
– E esta é uma ocasião especial – disse Sophia, deixando a sobremesa com cobertura de merengue à sua frente.
Ele franziu os olhos.
– Tudo bem. Pode me contar. O que está acontecendo?
A expressão de Sophia era de cautela.
– Quero trazer uma menina para me ajudar a manter a casa em ordem. Será por apenas um mês, até que minha tendinite fique curada. Um par de mãos auxiliar seria uma grande ajuda, e eu faria um bem à sociedade. Não perderíamos nada.
Joe olhou para a atadura que Sophia usava no pulso havia duas semanas. Ele sabia que ela trabalhava duro, e que uma ajuda poderia ser interessante, mas preferia manter a villa com o menor número de funcionários possível. Não porque não quisesse gastar mais dinheiro; ele poderia pagar o triplo para que todos o deixassem em paz.
– E quem você está pensando em contratar?
– Uma menina que está precisando de um pouco de direcionamento na vida.
Joe bufou mentalmente. Ele poderia ter empregado uma série de governantas, mas escolhera justamente uma reencarnação argentina da Madre Teresa de Calcutá.
– Nós tínhamos combinado que suas obras de caridade se restringiriam aos jardins e estábulos, certo?
– Eu sei, mas essa menina será presa se...
– Presa? – perguntou ele. – Você está querendo trazer uma pessoa que foi condenada para esta casa?
– Ela só esteve envolvida em confusões uma ou duas vezes – disse Sophia. – Aliás, é possível que o tal homem merecesse...
– O que ela fez para esse homem?
– Ela arranhou o carro novinho em folha dele... usando uma chave.
Joe sentiu um nó na garganta ao pensar em seu Aston Martin ainda praticamente sem uso, que guardava na garagem de casa.
– E imagino que ela disse ter sido um acidente, certo?
– Não, ela admitiu tudo – disse Sophia. – E ficou orgulhosa do que fez. Além disso, ela grafitou a parede do escritório dele com uma tinta difícil de ser apagada.
– Que maravilha. Isso parece ótimo.
– Então, você concorda? Eu posso trazer a menina?
Joe ficou olhando para a expressão de esperança no rosto da governanta. Seu sarcasmo se perdia naquela inocência. Sophia era a pessoa mais encantadora que ele conhecia. Sempre pensava nos outros. Sempre ajudava todo mundo. Sempre tentava fazer a diferença na vida das pessoas. E Joe sabia que ela vivia muito só, sobretudo desde que seus dois filhos maiores de idade foram morar no exterior, em busca de trabalho. Qual seria o problema em aceitar um mísero pedido seu? Afinal de contas, ele estaria muito ocupado dali para a frente. Tinha menos de um mês para resolver as pendências de um software que seria submetido à aprovação da equipe de pesquisa.
Ele deixou escapar um longo suspiro.
– Acho que você não teria nenhuma outra ideia para conseguir ajuda, certo?
Sophia o encarou e disse:
– Espere até conhecê-la. Você vai adorar essa menina.
DEMI PENSOU em correr quando a van parou, mas o tamanho da villa e seus arredores a fez parar. Era grande. Muito grande.
Enorme. Provavelmente teria um CEP só seu. Quem sabe até um partido político próprio. A casa tinha quatro andares, era alta, construída em estilo neoclássico, com jardins espetaculares e luxuriantes, além de campos que terminavam em um bosque fechado. Nunca havia visto algo assim em toda a sua vida. E não havia cercas altas, eletrificadas. Não havia vigias, nem guaritas, nem pessoas vestindo uniformes de segurança. Pelo menos ela não vira nada disso. Parecia um hotel de altíssimo nível, um resort de luxo e muito privado, construído especialmente para os ricos e famosos. E isso a fez pensar por que fora enviada ali.
Claro que ela não esperava um local caindo aos pedaços, mas ainda assim... Aquilo era realmente inimaginável.
– Será apenas um mês – disse Natalia Varela, que lhe arrumou o emprego, assim que os portões decorativos de ferro foram abertos, de forma eletrônica, permitindo que entrassem no longo caminho que levava à villa imaculadamente mantida. – E posso garantir que você conseguiu um bom posto, se considerarmos sua experiência. Eu conheço muita gente que daria tudo por uma oportunidade como essa.
Demi sorriu. Depois cruzou os braços sobre o peito. Cruzou também a perna direita sobre a esquerda. E moveu o corpo, várias vezes, de um lado a outro. Estava agitada. Por que deveria parecer contente? Por que deveria fingir estar agradecida por ser enviada para viver com um homem que não conhecia, em sua villa gigantesca, antiga e luxuosa?
Um mês...
Trinta dias morando com um estranho, com um homem que, de bom grado, parecia disposto a “ajudá-la a melhorar”. Rá, rá.
Como se isso pudesse acontecer. Aliás, quem seria esse homem?
Tudo o que ela sabia era que se tratava de um nerd que trabalhava no ramo da tecnologia, um inglês que estava se saindo muito bem na Argentina criando softwares para telescópios espaciais usados no Deserto do Atacama, no Chile.
Ah, e, aparentemente, esse homem era solteiro.
Demi bufou. Ele concordara em aceitar uma mulher que só arrumava confusão em sua casa, e por meros propósitos altruístas? E as autoridades do regime penitenciário tinham caído nessa balela?
Ah, claro. Ela sabia tudo sobre homens e suas motivações traiçoeiras.
Após terem recebido a aprovação da equipe de segurança, ditada pelo interfone, Natalia atravessou os portões, que se fecharam rapidamente.
– Joe Jonas está fazendo um grande favor a você - disse ela. – Ele só concordou... e após muito relutar... porque sua governanta está com tendinite no pulso. Você será a mão direita dela. Trata-se de uma oportunidade incrível. Este lugar é uma espécie de resort cinco estrelas. Será uma ótima experiência profissional para você. Espero que tire o melhor proveito possível.
Experiência profissional para quem? E para que tipo de trabalho?
Demi se perguntou tudo isso, com um sorriso cínico no rosto. Ninguém a transformaria em governanta simplesmente porque ela cometera certos erros, que, na verdade, nem foram erros, pois seu padrasto sem dúvida sabia o que estava por vir. Aliás, aquele carro era uma lata velha. Pelo amor de Deus... Ele poderia muito bem mandar pintá-lo com spray após o incidente, certo?
Demi não seria uma empregadinha de um ricaço, não passaria o resto dos seus dias esfregando o chão daquela casa. Não criaria calos gigantescos em suas mãos e joelhos em nome de outra pessoa. Seus dias de escrava tinham chegado ao fim. Joe Jon-sei-lá-o-quê ficaria em choque se estivesse imaginando que poderia explorá-la para satisfazer suas nefastas necessidades.
No entanto, e se ele não estivesse planejando escravizá-la na sua cozinha? E se os seus planos fossem mais audaciosos? Por experiência própria, ela sabia que homens com dinheiro costumam ter tudo e todos que queiram. Essa história de que ele “relutara” ao aceitá-la em sua casa era uma bobagem. No entanto, é claro que ele teria dado essa desculpa. Afinal, não gostaria de bancar o louco ou depravado. Ao ajudá-la, ele estaria “dando sua parcela de contribuição à sociedade”.
Vamos em frente, ela disse a si mesma. Vamos ver até onde você consegue chegar.
– Ah, claro. Eu vou tirar o melhor proveito possível dessa experiência – disse Demi, com um sorriso amarelo no rosto, encarando a mulher responsável por enviá-la àquela casa. – Pode ter certeza disso.
Natalia deixou escapar um leve suspiro ao pensar no que ela acabara de dizer.
– Sim, e é exatamente isso que eu temo.
A GOVERNANTA, que ela conhecera havia alguns dias, recebeu Demi na porta da villa, enquanto Natalia atendia uma ligação urgente envolvendo outra das meninas que cuidava.
– É um prazer recebê-la por aqui, Demi – disse Sophia. – Entre. O senhor Jonas está ocupado neste momento, então eu mesma lhe mostrarei sua suíte, para que você possa se instalar.
Demi não esperava um comitê de boas-vindas, cartazes nem bolas de gás, muito menos uma banda de música, mas o tal homem, o dono da casa, poderia ao menos ter aparecido rapidamente por ali, certo? Se ele concordara em recebê-la, o mínimo de educação por sua parte seria conhecê-la, ainda que brevemente.
– Onde ele está? – perguntou ela.
– Ele não deve ser perturbado neste momento – respondeu Sophia. – Venha, eu quero mostrar a suíte que prepa...
– Perturbe-o, por favor – disse Demi. – Agora.
Sophia ficou um pouco assustada.
– Ele não gosta de ser interrompido quando está trabalhando. E não permite que ninguém entre em seu escritório, a menos que seja uma emergência.
Demi olhou para a porta que imaginava dar acesso ao escritório. Era a única porta fechada por ali, e o corredor era bem comprido. Ela não bateu. Simplesmente girou a maçaneta e entrou.
Um homem ergueu os olhos por trás da mesa em que estava sentado, teclando em seu computador. Seus dedos ficaram paralisados assim que ela entrou, com o som da última tecla ecoando no ambiente silencioso.
E ele a encarou.
Demi respirou fundo, preparando-se para dizer alguma coisa, mas por algum motivo não conseguiu pronunciar uma única sílaba. Ela estava chocada. Aquele homem não se parecia em nada com o que ela imaginara. Não combinava com suas expectativas. Ele não era velho, nem mesmo de meia-idade.
Teria trinta e poucos anos, e seu rosto era lindo, como de um astro de cinema, além de ser atlético e bronzeado. Seus cabelos eram escuros e fartos, com ondas perfeitamente delineadas. Tais cabelos pareciam ter sido recentemente arrumados com as pontas dos dedos, tamanha era a perfeição. Aquela parecia a imagem de um homem capaz de arrastar qualquer mulher à sua cama sempre que desejasse. Seu queixo era determinado, seu nariz, protuberante e sua boca, sensual e perfeita. Por alguma razão, não muito oculta, isso tudo fez os joelhos de Demi tremerem.
Ele arrastou a poltrona para trás e, assim que se levantou, a sala ficou imediatamente menor.
– Posso ajudá-la? – perguntou ele, com um tom de voz que sugeria não estar nada motivado para ajudar quem quer que fosse.
Demi nunca fora mulher de ficar sem palavras. Sua tática era sempre mergulhar de cabeça, envolvendo o interlocutor em uma verborragia sem fim.
– Você sabe a falta de educação que significa ignorar seus convidados quando eles chegam em sua casa?
Ele a encarava com toda a firmeza possível.
– Em sentido estrito, você não é minha convidada, nem mesmo minha hóspede. Quem chamou você aqui foi a Sophia.
Demi ergueu o queixo, encarando-o da melhor maneira possível.
– Eu gostaria de avisar, já neste nosso primeiro encontro, que não estou aqui para bancar seu brinquedinho sexual.
Ele ergueu as duas sobrancelhas escuras, deixando seus olhos azuis completamente arregalados.
Com seus cabelos fartos e sua pele dourada, Demi esperava que seus olhos fossem castanhos. No entanto, eram de um azul safira, completamente hipnotizadores. Ele pareceu observá-la por alguns instantes, fitando seus cabelos, olhos e boca.
Ela sentiu um nó na garganta e um aperto no peito. Se tinha alguma coisa que odiava, era ser alvo de brincadeiras, de gozação, de ironias.
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