Capítulo 2

– Como vai, senhorita... 
E olhou para a sua governanta, que surgira logo atrás de Demi, de repente. 
– Senhorita Lovato – disse Sophia. 
– Demi – corrigiu ela, com um olhar duro. 
Joe esticou sua mão. 
– Como vai, Demi? 
Ela olhou para aquela mão como se Joe a estivesse oferecendo uma víbora. 
– Pode guardar seus cumprimentos para outras pessoas. 
Natalia entrou no escritório, um pouco aturdida. 
– Sinto muito, doutor Jonas. Sinto muito mesmo, mas precisei atender a ligação de outro cliente... 
Demi girou o corpo e franziu a testa para Natalia. 
– Doutor? Você não me disse que ele era doutor. O que me disse é que era um nerd, uma espécie de geek, como chamam atualmente. 
A governanta olhou para Joe com um sorriso amarelo estampado no rosto, depois disse a Demi: 
– O doutor Jonas é Ph.D. em astrofísica. E é de boa educação chamá-lo utilizando o título correto. Se ele quiser, claro. 
Demi voltou a olhar para Joe. 
– Como você quer ser chamado por mim? Senhor? Mestre? Meu Literato? Minha Alteza? 
Ele moveu os lábios, como se tentasse evitar um sorriso que insistia em ser aberto. 
– Pode me chamar de Joe mesmo. 
– Como Júlio César? 
– Exato, mas como antigamente: Joe. 
– Você gosta de Shakespeare? – perguntou Demi, que parecia não conseguir controlar sua verborragia. No entanto, não havia motivo para demonstrar qualquer conhecimento frente àquele homem. Melhor deixá-lo pensar que ela era uma mulher nada sofisticada e sem educação. Uma qualquer. 
– Não, mas os meus pais sim. 
– Por que você aceitou me receber nesta casa? – perguntou ela, encarando-o firme. 
– Eu não queria que você viesse para cá – respondeu ele, também sem rodeios. – Mas as circunstâncias atuais da minha governanta impediram uma recusa da minha parte. 
Demi cruzou os braços à altura do peito. 
– Eu não sei cozinhar – disse ela, com um olhar que parecia perguntar: o que você vai fazer quanto a isso? 
– Mas é capaz de aprender, sem dúvida – respondeu ele. 
– E odeio arrumar casas – continuou ela. – É uma posição muito sexista imaginar que as mulheres devem arrumar as casas. 
O simples fato de termos peitos e ovários não significa que... 
– Acho que já entendi – disse ele, interrompendo-a rapidamente. Tão rápido que Demi ficou preocupada, imaginando que ele poderia começar a listar todas as atividades supostamente femininas que ela deveria encarar. – No entanto, você precisa cumprir a sua cota de serviços prestados à comunidade – disse ele. – E eu preciso de alguém que dê uma ajuda por aqui, pelo menos até a Sophia melhorar. Nesse jogo, não existe perdedor. 
Demi deixou escapar um ruído de sua garganta e soltou os braços ao lado do corpo. Depois olhou para Natalia e perguntou: 
– Você checou a ficha policial dele? Sabe se ele está limpo? 
– Eu posso garantir a você, Demi, que o doutor Jonas é um homem completamente confiável – disse Natalia. 
Demi ergueu o lábio superior, analisando Joe com o olhar. 
– Você bebe? – perguntou ela. 
– Socialmente. 
– Fuma? 
– Não. 
– Usa drogas? 
– Não. 
Demi ergueu ligeiramente os braços, depois perguntou: 
– E quanto ao sexo? 
– Demi... – disse Natalia. 
– O que foi? – perguntou ela, em um tom petulante. 
– Você está deixando o doutor Jonas sem graça. 
– Eu não estou sem graça – disse ele. – Mas não vou responder a uma pergunta tão petulante. 
Demi tossiu e deixou uma risada escapar no ambiente. 
– Isso significa que não vai responder a nada, certo? 
Joe a encarou com um olhar que fez as entranhas de Demi darem um nó. Ele não parecia ser um homem de meias palavras, mas sim um homem que sempre sabia o que queria. E Demi sentiu seu enorme poder de atração. Nesse momento, sua mente foi tomada por uma série de imagens de Jonas cortejando mulheres. Ele não parecia fazer o tipo rápido no gatilho. Seria calmo, usaria o tempo necessário. E sem dúvida saberia como percorrer o corpo de uma mulher, como levar uma mulher aos céus. E ela enxergava tudo isso por conta do seu olhar penetrante. 
– Aproveitando que entramos no assunto – disse ele. – Eu gostaria que você se abstivesse de trazer homens aqui, sobretudo com a intenção de manter relações íntimas com eles. 
– Quer dizer que... você pode fazer sexo, mas eu não? Isso é... – Demi baixou o tom de voz, que ficou deliberadamente mais rascante. – A menos que estejamos juntos, certo? 
– Eu preciso ir embora – disse Natalia, assim que seu telefone começou a ser bombardeado com uma série de mensagens. – Demi, eu espero que você se comporte no tempo que passar por aqui. Esta será sua última chance, não se esqueça disso. Caso falhe, você sabe muito bem para onde será enviada. 
– Sim, sim, sim... – disse Demi, com uma expressão de chateação nos olhos, e girou o rosto a uma das janelas ao lado das estantes com livros. Ela não queria ir para a prisão, mas ao mesmo tempo não queria ser explorada por outro homem que supunha ter algum poder sobre sua vida. Se Joe Jonas queria uma bonequinha para alimentar suas fantasias, por que não escolhia uma da sua laia, ao melhor estilo nerd? Uma nerd “lindinha”... claro. Ela não fazia o seu tipo. Claro que não. Demi só usava roupas de lojas baratas. Isso sem contar seu background, que vivia tentando esconder. 
Ela foi tomada de assalto por esses pensamentos. Nem com um banho de loja e uma limpeza a fundo conseguiria remover tantas camadas de sua personalidade. 
Joe Jonas nascera em berço de ouro. Isso era visível pela maneira como ele se vestia, pela maneira como exalava uma confiança total, e por sua autoridade misturada a um ar de tranquilidade. E Demi também percebera a mobília à sua volta. Ele se cercava de quadros caríssimos, de centenas de livros, e as paredes daquele cômodo estavam revestidas de painéis de madeira, provavelmente uma madeira muito nobre. 
Ele certamente não passara a infância em um ambiente onde reinava o medo e a falta de constância. Não fora obrigado a lutar para sobreviver. Joe tinha tudo o que queria, sempre ao alcance da mão. 
Sendo assim, por que aceitaria que ela ficasse em sua casa sem querer tirar proveito da sua presença? Ela trincou os dentes, determinada. Ele nunca a usaria. Antes que isso acontecesse, ela o usaria. 
– VOU LIGAR todos os dias para saber como ela está se saindo. – Natalia avisou a Joe, apertando sua mão. – É muita gentileza da sua parte comprometer-se com o nosso projeto. Nós já ajudamos muita gente a reverter o curso de suas vidas. 
– Tenho certeza de que tudo ficará bem – garantiu Joe. – Sophia será a melhor mentora possível. 
– Ainda assim, é muito gentil abrir sua casa dessa maneira. 
– Minha casa é grande – respondeu ele. Embora talvez não seja grande o suficiente. 
Joe se virou de costas assim que Sophia escoltou Natalia para fora do seu escritório, mas acabou percebendo que Demi continuava encarando-o. 
– Quanto eles vão pagar para que você me aceite aqui? – perguntou ela. 
– Eu disse que deveriam doar tudo à caridade – respondeu ele. 
 Que coração tão generoso... 
Ele se apoiou no parapeito da janela que ficava logo atrás da sua mesa, com as mãos pousadas na cintura, como se a analisasse. Tratava-se de uma pose casual, que espelhava o humor que a presença de Demi lhe causava. Ele sentia seu sangue correndo quente pelas veias, o que não acontecia desde a sua juventude. Ele a observava atentamente, Demi tinha uma expressão desafiadora no rosto e movia seus olhos cor de caramelo e sua boca carmim. Um pequeno diamante brilhava na narina direita de Demi. A ponta do seu nariz tinha pequenas sardas que o faziam se lembrar do creme colocado em cima de certas sobremesas. No entanto, ele não poderia ser mais doce na sua percepção. Ela parecia uma menina amarga e seca, sempre preparada para a luta. 
Algo naquela crueza deixava Joe sem saber o que pensar. Não... a melhor definição de como ele ficava talvez não fosse essa, ele pensou, enquanto continuava observando-a. A sensualidade de Demi era terrenal, crua. A forma como ela movia o corpo... A forma como habitava o próprio corpo... E o corpo de Joe reconhecia tal comportamento, como se ele fosse um garanhão frente a um potencial acasalamento. 
Ele forçou sua mente a sair daquele atoleiro. Claramente, precisava organizar melhor a sua vida. Não poderia sentir atração por coisas tão insignificantes. 
Seu rosto não era o que se poderia chamar de uma beleza clássica. Ele observou as maçãs altas e arrogantes, que poderiam ser cortadas como um presunto de Natal. E os cílios eram grossos e longos, sem a ajuda de rímel. Sua pele (além das sardas e do piercing de diamante) parecia sedosa. Seu cabelo era uma massa de cachos até os ombros, cheio de movimento, com certas tonalidades de marrom, além de algumas mechas vivas de rosa. 
Joe ainda estava esperando que ela fizesse a conexão entre ele e seus pais, o que não costumava demorar tanto tempo para acontecer, e normalmente produzia uma série nauseante de comentários: Ah, você é o filho dos famosos atores do West End de Londres: Richard Jonas e Elisabetta Albertini! Você poderia conseguir seus autógrafos? Um convite para a estreia? Assentos na primeira fila? Um passe ao backstage? Um teste? 
Mas a senhorita Demi Lovato nunca tinha ouvido falar dos seus pais… ou não ficara impressionada com a sua linhagem. 
Joe teve de admitir que achou sua franqueza estranhamente atraente, uma novidade refrescante. Ele tinha sua quota de bajuladores, de pessoas que só queriam participar de sua vida por causa de sua ligação com a realeza do teatro de Londres. Mulheres que queriam ser exibidas por ele no tapete vermelho, na esperança de fisgar o olho de um agente de casting. E foi interessante estar na presença de alguém que não dava a mínima para a superficialidade da vida célebre de seus pais. 
Joe não se importara muito com a palavra “guardião”, que a assistente social usara ao fazer referência a ele. Isso fez com que ele parecesse décadas mais velho do que seus 33 anos. Demi seria mais jovem do que ele, certamente, mas cerca de sete ou oito anos, no máximo. Teria uns 25 anos, mas era uma mulher endurecida por conta de suas experiências. Ele enxergava isso em seus olhos. Não havia um brilho de inocência naquele olhar. 
Era um olhar frio, de cinismo duro. O único brilho visível parecia indicar: não mexe comigo que eu não sou fácil de se levar. No entanto, o que a levara a uma vida de pequenos crimes? Ele vira a lista de seus crimes: roubo, danos intencionais a propriedades, grafite, vandalismo… 
A missão de Sophia poderia ser um pouco mais difícil do que ele esperava. E ele só concordou com isso porque confiava no juízo de sua governanta… mas o julgamento de Sophia claramente não era o que costumava ser. Demi surgira dando passos largos, como se fosse um turbilhão, perguntando a ele sobre sua vida sexual… Pelo amor de Deus! 
Ele sabia que estava agindo e soando como um professor severo. Mas achava melhor estabelecer as regras do jogo logo no início. E não permitiria que Demi comandasse bebedeiras ou orgias sob seu teto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Espero que tenham gostado do capítulo :*