Capítulo 18 Maratona


Demi o observou enquanto bebericava seu vinho.  
— Você sabe mesmo viver em grande estilo, Joseph.   
Ele não respondeu. Porém, Demi tinha tantas perguntas a fazer... Fortificada pela comida excelente, não resistiu à pergunta que mais a incentivava:  
— Quantas pessoas até hoje ultrapassaram suas barreiras? — murmurou.  
— Poucas — respondeu ele, com a voz rouca e baixa.   
Era a abertura que Demi queria.  
— Então se torna ainda mais surpreendente o fato de ter me chamado de sua noiva na frente dos jornalistas.  
— Já lhe disse que é a melhor solução. Nós nos casaremos o mais depressa possível para legitimar o bebê. Assim, minha consciência ficará tranquila, a House of Jonas obterá o herdeiro que precisa e não necessitarei me preocupar com publicidade maliciosa. As coisas melhorarão ainda mais quando o bebê nascer. Criaremos a imagem perfeita de família feliz.  
Ele delineava seus planos com muita facilidade. Demi mal podia acreditar no que ouvia.  
— Vai usar nosso filho como uma oportunidade?   
Ele sorriu como um lobo.  
— Irei proteger meu filho com todas as forças. Nunca deverá ser molestado por publicidade barata. E também não será usado pela mãe para exibição como se fosse mais um acessório da moda.  
Momentaneamente surpresa, Demi reagiu tentando rir.  
— Você parece um assessor de imprensa, Joseph  
Ele a fitou com seriedade.  
— Sou realista. Por isso a avisei para não se apaixonar por mim, não me amar.  
Demi sentia muita coisa por ele nos últimos tempos, mas talvez amor não fosse a palavra certa. Desejo e luxúria, sim. Mas, amor? Sem experiência em amar e ser amada, como poderia ter certeza?  
Rapidamente refletiu que era melhor ser hóspede na Villa da Toscana do que ser uma mãe solteira na Inglaterra. Sorriu de maneira provocadora, tentando achar uma brecha na armadura de Joe.  
— Nunca lhe ocorreu, Joseph, que possa tê-lo obedecido, mas não me apaixonado por você, e que passei a odiá-lo por me abandonar? Já pensou que posso recusar sua oferta de me mudar para cá?  
Suas palavras só provaram para ele o quanto era inexperiente.  
— Não... Nem por um segundo. Vi que precisava de ajuda. Sou a pessoa certa para ajudá-la. Não há como você me recusar. — Fez uma pausa e acrescentou: — Pronta para a sobremesa?  
Fitou o prato dela, que continuava cheio, pois Demi estivera muito envolvida na conversa para se lembrar de comer. Ela acenou, demonstrando que sim. Falar poderia quebrar o encanto.  
Uma empregada surgiu não se sabe de onde, e colocou um magnífico doce no meio da mesa.  
— Os franceses chamam isso de ninho de abelhas — explicou Joe, partindo uma fatia. — Aceita?  
O bolo tinha uma massa muito macia recheada com creme.  
— Não posso recusar algo que parece tão delicioso — disse ela, corando ao ver o brilho nos olhos de Joe.  
Deixando-a louca de desejo, Joe lhe passou o prato com o pedaço de bolo. Foi mais uma desculpa para que suas mãos se encontrassem.  
— Espere... Não comece a comer ainda. Falta o toque final — disse ele.  
A mesmo empregada ressurgiu com um jarro de mel.  
— Não vai deixar o bolo doce demais? — perguntou Demi, arqueando as sobrancelhas.  
— Meu chef usa menos açúcar na receita. Mel é o acompanhamento ideal. Produzido na Villa Jonas.  
Encorajada, Demi sentiu o perfume suave do doce.  
— Experimente — disse ele.  
Ela hesitou, pois até então só experimentara mel comprado no supermercado, e não gostara. Porém, Joe sabia ser persuasivo. Demi se serviu de um fio de mel sobre a fatia de bolo.  
— Não se parece com nada do que comi antes — aprovou, sorrindo.  
— Quer mais? — murmurou Joe.  
— Oh, sim... — respondeu Demi com o fôlego curto, que nada tinha a ver com o mel.  
Seus joelhos voltaram a se encostar debaixo da mesa, e Demi desejou que fosse uma simples coincidência, e nada mais.  
— Esse bolo é uma experiência e tanto, não? — quis saber Joe.  
— É maravilhoso. — Demi comeu até a última migalha e depois se recostou na cadeira com um suspiro. — Cada garfada foi divina.  
— Fico feliz que tenha gostado. — Joe a observava com atenção. — Quer café?  
— Melhor não, — replicou Demi, com pena. Aceitaria qualquer desculpa para continuar sentada em frente a ele... Menos essa. — Não suporto o cheiro do café desde...  
— Posso imaginar — retrucou Joe, antes que ela mencionasse a gravidez. — Dizem que a gestação afeta sua vida em quase tudo.  
Ela aquiesceu com um gesto de cabeça, porém emoções fortes a assediavam, e nada tinham a ver com sua gravidez, mas com Joe.  
— Afetou a minha vida também — disse ele com simplicidade. — Quer dar uma volta para conhecer seu novo lar? Se não estiver muito cansada — acrescentou com tolerância.  
A ideia de percorrer uma Villa maravilhosa ao entardecer era divina. E o fato de ser Joe seu guia era estupendo.  
Depois de um início incerto, o dia transcorrera como um sonho. Demi fora atirada em um novo mundo. Havia tanto a aprender, e, apesar da aparência solene de Joe, ela só queria ficar ao lado dele.  
Talvez acordasse para descobrir que tudo não passara de um sonho. Tudo desapareceria como uma bolha de sabão. Podia ser. Afinal, Joe já sumira da sua vida uma vez, levando sua felicidade. O que o impediria de agir da mesma maneira de novo?  
Então ela aceitou fazer o passeio, determinada a não se deixar surpreender demais.   
Mas foi impossível, porque havia belezas por toda a parte para admirar. A Villa possuía até um SPA. Só os vestiários eram maiores que seu chalé na Inglaterra. Quando Joe a conduziu até a piscina e o bar, precisou fechar a boca para não demonstrar tanta admiração.  
— Você precisa fazer exercícios, Demi. Andei pesquisando e soube que natação é algo que pode praticar até o bebê nascer.  
Demi olhou em volta para os vasos de terracota, o chão e as paredes de ladrilhos brilhantes perto da piscina, e exclamou:  
— Parece um jardim tropical!  
Folhagens exóticas circundavam o bar. Palmeiras e bananeiras se agitavam com a brisa suave. Notou plantas enormes que nunca vira antes, e Joe explicou:  
— As originais vieram do exterior e logo se desenvolveram por aqui porque amam o lugar.  
Demi percebeu que se aproximara dela e sentiu o calor de seu hálito no pescoço.  
— Fico feliz que fiquem e amem a Toscana... Contanto que se comportem — murmurou ele.  
Demi imaginou se a mesma regra se aplicaria a ela. Se Joe gostava de dominar criaturas selvagens, sem dúvida poderia fazer isso com pessoas também e com maior facilidade.  
Ele inspirava sentimentos conflitantes. Desde que o conhecera, Demi tivera consciência de que nenhum outro homem entraria em sua vida. Sua partida inexplicável de Jolie Fleur quase a matara de tristeza. Sua autoestima fora arrasada. Ao descobrir que esperava um filho, preparara-se para dar a ele uma vida muito melhor do que a que tivera, e isso lhe dera forças para prosseguir. Por isso precisava concordar com os planos de Joe agora.  
Por mais bizarras que fossem suas ideias de trazê-la para a Itália é se casar sem amor, pelo menos daria ao bebê a chance de uma infância perfeita.  
E, quem sabe, eventualmente eu também tenha uma chance de ser feliz, pensou, ousando lançar um olhar enviesado para Joe, que a conduzia pela vasta mansão ancestral. Até se conhecerem, Demi passara todos os seus vinte e três anos de vida se preocupando como que os outros pensavam a seu respeito. Depois, por alguns dias gloriosos de verão, Joe afastara todos os seus temores. Preenchera sua mente e seus sentidos até que nada mais importara.  
E as lembranças boas sempre superavam as más. Admirava a beleza máscula de Joe sempre que pensava ser seguro. A presença calma e poderosa dele inflamava seus sentidos e, a julgar pelo queixo erguido e os ombros eretos, ele também estava travando sua batalha pessoal para conter os impulsos.  
Chegaram ao grande vestíbulo da entrada no térreo.  
— Foi aqui que cheguei. Deve ser o final de nosso passeio — disse ela, com tristeza.  
Tentava não olhar para a porta do escritório dele, onde ficara tão envergonhada por causa do enjoo súbito. Sentiu um calor intenso percorrer seu corpo ao lembrar que vomitara não apenas uma vez, mas duas, na frente de Joe.  
Porém ele parecia nem se lembrar disso, pois anunciou, abrindo a porta do escritório:  
— Ainda precisa conhecer a suíte principal. — Ele encostou-se ao batente e aguardou.  
Não havia como escapar. Demi precisou passar por ele.  
O escritório de Joe exalava um odor gostoso de papel de alta qualidade e móveis novos.  
Dessa vez, não sentindo a premência de correr para o banheiro anexo, ela teve tempo para apreciar os vasos com plantas e flores que recobriam todos os cantos.  
Dali, Joe a conduziu para o elevador particular que os levaria ao alto da casa outra vez. Quando as portas com espelhos se abriram, ela se viu em um mundo de sons abafados por um espesso carpete cor de creme e folhagens exóticas. Como o SPA da Villa, havia palmeiras e orquídeas por todos os cantos.  
Quando alcançaram a área dos aposentos particulares de JoeDemi ouviu o som de pássaros.    
— Oh, um viveiro! — exclamou, vendo aves tropicais voejando entre as folhagens em um canto protegido. — Sempre quis um assim!  
Joe não demonstrou entusiasmo e a acompanhou até uma enorme gaiola dourada no final do vestíbulo. De início, os pássaros pareceram assustados com a presença de Demi, porém, quando reconheceram Joe, voltaram a se tranquilizar e prosseguir no seu voo.  
— Queria de verdade? Dio seria a última coisa que eu gostaria de ter — disse ele, espantado. — Mas o viveiro sempre esteve aqui. Meu pai gostava de aves. Não aprovo que se aprisionem pessoas ou animais, mas essas pequenas criaturas recebem todos os cuidados vinte e quatro horas por dia. Então terão um lar aqui por toda a sua vida. Porém, quando morrem, nunca os substituo coitadinhos.  
Joseph sorriu para as aves de um modo que enterneceu Michelle.  
— Mas, vamos lá... Está ficando tarde. Poderá visitá-los de novo depois que conhecer o resto de minha suíte.  
Demi olhou em dúvida para as portas duplas cor de creme ao fundo do vestíbulo.   
O cheiro de tinta fresca atingiu suas narinas. Sentia-se uma intrusa ali.  
— Não sei... Mal nos conhecemos...  
— É a mãe de meu filho, e a apresentei para todos que vi hoje como minha noiva. Não há ninguém melhor qualificada para julgar a nova decoração que fizeram para mim.  
Empurrou-a para uma grande sala de estar contígua ao vestíbulo. Era sofisticada, nas cores, verde-clara e creme, e ainda mais bonita por causa dos tapetes escuros, antiguidades e quadros de bom gosto. Demi não conseguia deixar de arregalar os olhos para tudo. A cada canto se admirava com uma peça linda, mas Joe parecia não se incomodar com nada. Conduziu-a por altas portas-janelas até um terraço.  
Um peitoril de grades era a única coisa que os separava do cenário à frente.  
A noite caía depressa, e Demi admirou o grande espaço coberto por colinas que circundavam as terras ancestrais de Joe. O brilho distante de luzes mostrava a estrada serpenteando pelo vale Tiebolino. De vez em quando, a silhueta de uma coruja                                                   surgia nos castanheiros. Seu pio solitário ecoava como uma música melancólica pelo campo.  
— Posso passar muito tempo aqui e nunca me canso — disse Joe, em um tom confidencial que Demi não ouvia há muito tempo. — Em geral, tudo isso está sempre deserto quando tenho tempo de ficar aqui, mas de vez em quando uma pessoa surge no meu campo de visão por alguns momentos... Um de meus empregados ou um trabalhador dos campos. Consigo ouvir algumas palavras ou testemunhar uma cena... Depois eles desaparecem.  
Havia um tom de satisfação na sua voz. Demi estava intrigada; jamais conhecera alguém que gostasse de observar os outros à distância como ela gostava. Até então imaginara que a vida de Joe como grande executivo fosse repleta de pessoas em volta com muita animação.  
— É a situação perfeita, não acha? — disse ela sorrindo. — Por alguns minutos, pode desfrutar de uma intimidade com os outros sem que esperem nada de você. Você os vê e eles não, e observar aqui de cima é a camuflagem perfeita. Gostaria de ter um ponto de observação assim no meu chalé da Inglaterra.  
— Por que precisa se esconder? — perguntou ele de supetão.  
— Oh, sempre me sinto mais feliz quando passo despercebido.   
Joe levou alguns segundo para replicar, e suas palavras soaram amargas e experientes.  
— Pelo menos você teve escolha. Eu me escondo às vezes para ter um pouco de paz.   
Demi riu.  
— Deve estar brincando! Minha mãe me inscrevia no concurso Miss Bolha de Sabão todos os anos desde que eu tinha um ano de idade.  
— Miss Bolha de Sabão? — repetiu Joe, com expressão curiosa.  
— É um concurso de beleza nacional patrocinado por uma indústria britânica de sabonetes — explicou Demi. — A vencedora tem sua foto publicada na embalagem durante um ano, e recebe seu peso em dezenas de produtos da empresa.  
Joe  tentou parecer impressionado. Não deu certo. Pela primeira vez, Demi pôde ler seus pensamentos. Sabia que no íntimo estava rindo dela, todo mundo ria... Em especial os juízes do concurso.  
— Alguma vez venceu? — perguntou ele, por fim.  
— Nunca... Em cinco tentativas. Minha mãe gastou uma fortuna com spray de cabelos e aulas de postura para mim, mas não deu em nada. E a cada vez ela ficava mais desapontada. Aliás, desapontou-se no momento em que nasci. Desejava uma bonequinha para vestir com rendas, mas em vez disso teve... Alguém como eu — disse Demi, abrindo as mãos em um gesto sem esperanças.  
Joe soltou uma gargalhada.  
— Acho que você está procurando elogios, não é?  
O olhar constrangido de Demi o fez falar com cinismo.  
— Ora, deixe disso! Vai me fazer chorar de pena, Demi. Sem dúvida não foi tão ruim ser mimada e cuidada por tanto tempo, foi? 


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