Capítulo 18


Joe comprou uma casa em Holland Park, uma área sofisticada de Londres pela qual Demi havia apenas passado de ônibus. 
Era uma casa grande de quatro andares, situada numa rua tranquila, ladeada de árvores, e habitada por várias famílias jovens. 
Aquele era o tipo de casa pela qual alguém podia facilmente se apaixonar, pensou Demi melancolicamente. A casa dele, lembrou ela, enquanto carregava um dos bebês pelo corredor de paredes forradas de carvalho. O vidro pintado da porta principal espalhava cores brilhantes sobre o chão preto-e-branco. 
Algumas horas depois de eles terem chegado, uma vizinha loira, fascinante, chamada Caroline, apareceu, trazendo uma garrafa de champanhe e um prato de sanduíches de salmão defumado acompanhados de um convite para que eles fossem até a festa que ela daria. 
— Você virão, não é? — perguntou ela a Demi, embora seus olhos e o sorriso estivessem focados no grego alto e silencioso que estava apoiado no umbral da porta. 
Demi realmente não soube como responder. Embora pudessem parecer uma família convencional, eles estavam bem longe disso. Aproximar-se dos vizinhos talvez exigisse um excessivo talento teatral nesse momento. 
— Vamos ver como conseguimos nos ajeitar por aqui — disse Demi diplomaticamente, percebendo que uma recusa total poderia fazer com que a vizinha atraente insistisse no convite. A casa era deslumbrante. O tipo de lugar em que ela jamais havia imaginado viver, com todos aqueles cômodos espaçosos e as suas escadas. A mudança de seu minúsculo apartamento para aquela mansão tinha se dado assustadoramente sem nenhum esforço de sua parte. Joe havia supervisionado tudo, tendo providenciado inclusive um decorador para encher a casa de móveis cuidadosamente escolhidos, e cortinas caras para as janelas que iam do teto ao chão. Havia um ótimo quarto para Alexius e Andréas com seu próprio banheiro. 
Joe tinha uma suíte só para ele no andar de cima com uma vista maravilhosa para o parque, onde poderia trabalhar, segundo explicara a Demi. Aquilo a fizera imaginar quais seriam seus planos e quanto tempo aquele arranjo poderia durar. 
Agora, porém, não era hora de fazer perguntas. Ela também duvidava de que ele lhe forneceria alguma resposta se ela o fizesse, portanto, por que se preocupar com algo que ela efetivamente não podia controlar? 
Aquela casa lhe proporcionava o espaço que ele havia lhe prometido, e no momento aquilo se sobrepunha a todos os outros problemas em potencial relacionados ao fato de compartilhar uma casa com homem tão perigosamente atraente como Joe. 
Ela se acalmou ao olhar para o belo jardim do lado de fora, com seus canteiros circulares e as árvores altas, imaginando dois meninos peraltas brincando por entre elas. Ia construir uma caixa de areia para eles, e providenciar um pequeno escorregador. Pensou nos bebês alimentados e adormecidos no andar superior em seu belo quarto todo decorado em creme e azul-celeste e sorriu. 
Joe a estava observando e registrou o leve curvar de seus lábios, fazendo-o lembrar de como a sua beleza tão particular o havia atraído tanto, sem falar naqueles olhos cor de violeta e seus cabelos cor de mel. 
Quanto tempo fazia desde que ele havia enterrado sua boca naqueles cabelos pela última vez? Quanto tempo desde o último beijo naqueles lábios? A frustração tomou conta dele. Joe não tinha dúvida de que Demi lhe responderia instantaneamente se ele fosse até lá e a tomasse nos braços, mas alguma coisa o deteve. Talvez o novo ar de serenidade que a envolvia como um manto. Ele já havia notado antes, quando a vira sentada numa cadeira, junto à janela do quarto das crianças, amamentando Alexius, enquanto seu irmão gêmeo dormia num moisés, a seus pés. A luz suave do sol a havia iluminado e conferido à cena um fulgor inesperado, transformando o mel de seus cabelos em ouro. Ele nunca a havia visto tão linda. 
— Demi? 
Ela se virou, tentando se defender do impacto que a visão dele sempre lhe causava. Joe estava sentado numa das poltronas com suas longas pernas estendidas, numa postura naturalmente elegante, com sua calça de corte bem feito moldada às coxas musculosas. Demi engoliu em seco. 
— Sim, Joe? 
Ele notou que ela havia voltado a usar jeans, sem muito alarde nem horas excessivas de exercício. Sua vontade era de arrancá-lo e... Maldita beleza! 
— Nós temos de discutir algumas coisas — disse ele com voz rouca. 
— Que coisas? — perguntou Demi. 
 Uma babá — disse ele lentamente. — A menos que você prefira fazer um esquema para dormirmos alternadamente. 
Demi respirou fundo, tentando ignorar o modo como os olhos negros corriam insolente-mente sobre seu corpo, como se tivessem esse direito. Ela já havia ouvido a expressão "despir com os olhos" antes, mas jamais a tinha compreendido em toda a sua extensão até conhecer Joe. A inegável tensão sexual que fervilhava sob a superfície, porém, era agora apenas uma faceta de sua vida que havia repentinamente se tornado plena. 
A maternidade era uma missão que ela descobrira que podia exercer muito bem, e isso havia lhe trazido muita calma e autoconfiança. 
A antiga Demi que havia desperdiçado seu tempo tentando agradar o exigente Joe não existia mais. 
— Eu não quero contratar uma babá — disse ela calmamente. 
Joe franziu a testa. Aquilo não era o que ele esperava. A riqueza podia pagar por ajuda e muitas mulheres gostavam disso. 
— Você tem idéia do trabalho que vai ter quando eles começarem a andar? Já pensou em como isso vai restringir a sua liberdade? 
— É claro que sim! Tudo vai demorar o dobro do tempo, só isso. Você bem que podia me orientar um pouco. Como é que sua mãe fazia? 
Houve uma pausa. Em outras situações, Joe teria rechaçado automaticamente aquela pergunta. Podia reconhecer sua importância naquele momento, mas isso não significava que ela lhe agradava. 
— Não creio que ela tenha sido exatamente um bom modelo para uma mãe de gêmeos — disse ele friamente. 
— Por que não? 
Joe a olhou com irritação. Ele detestava ter de revirar o passado. Antigamente, ela teria interpretado de modo correto sua expressão e se detido na mesma hora. Antigamente, na verdade, ela faria qualquer coisa para agradá-lo. Mas ela havia mudado. 
Passar por toda uma gravidez sozinha e então dar à luz dois bebês sem saber como ia fazer para sustentá-los faria qualquer mulher mudar. 
Será que aquilo lhe dava o direito de saber mais sobre a sua história? Sua relutância em lhe contar a verdade se devia a um desejo feroz de manter a própria privacidade ou ao fato de ter enterrado seus sentimentos muito fundo dentro de si mesmo e não querer ressuscitá-los depois de tanto tempo? 
—Porque minha mãe foi embora quando Kyros e eu ainda éramos muito jovens. 
Ela o fitou com o coração acelerado. 
— Foi embora! 
— Muitos pais deixam seus filhos, mas as mães, às vezes, também o fazem — disse ele, dissimulando, com um sorriso irônico, a dor de reabrir aquela velha cicatriz. 
— Quantos anos vocês tinham? 
— Quatro — disparou ele com um olhar impaciente. — Ela nos deixou com nosso pai, que era perfeitamente capaz de providenciar para que nós fôssemos bem cuidados. Kyros e eu crescemos bem. Não foi nenhum drama. 
— Deve ter sido muito difícil para o seu pai dar conta de dois meninos tão pequenos sozinho — disse ela lentamente. — Como foi que ele fez? 
— Nós tivemos um monte de babás diferentes que tomaram conta de nós — disse ele, dando de ombros. — Meu pai era um homem muito ocupado, movido pela ambição e pela vontade de prosperar. O trabalho lhe tomava todas as horas do dia. Essa foi uma das coisas que lançaram minha mãe nos braços de outro homem, pelo menos foi o que ela disse. Estava em busca de excitação e glamour, e um marido ausente e duas crianças exigentes não lhe proporcionavam exatamente isso. 
— Você nunca se encontra com ela? 
— Ela morreu poucos anos depois de partir. Nós só a vimos duas vezes desde que ela foi embora. 
Joe se lembrou do homem com quem ela havia casado, aquele que tinha substituído seu pai, e de como ele havia querido socá-lo na época. 
Demi assentiu. Aquelas respostas só estavam provocando cada vez mais perguntas em sua mente. Ela teve vontade de fazê-las, mas sabia que a última coisa que Joe queria era uma psicóloga amadora. Algo na expressão dele parecia adverti-la a não forçar aquela conversa. Para um homem como Joe, cujas emoções eram tão resguardadas, aquilo já fora uma grande revelação. Seu comportamento, agora, começava a parecer mais compreensível, fazendo, inclusive, com que ela se sentisse culpada por tê-lo avaliado mais como um tipo, e não como um homem. Seu cinismo não havia brotado do nada. O fato de ter crescido sem uma figura feminina que exercesse o papel de mãe explicava em grande parte sua atitude para com as mulheres. 
Demi ficara perturbada. Por trás de sua afirmação de que sua vida não tinha sido um drama e da expressão dura como pedra em seu belo rosto, ela conseguira ver a dor do menininho que havia sido abandonado. Por que ele e o irmão não eram tão próximos como se esperava depois de terem passado por uma experiência tão difícil juntos ainda quando crianças? Antigamente, ela pisava em ovos quando se tratava dos sentimentos dele, mas agora não mais. Queria superar todo tipo de fingimento e subterfúgios. Não por ela, uma vez que sabia que tudo o que havia existido entre eles tinha chegado ao fim, mas por causa das crianças. Duas confidencias num só dia, porém, era coisa demais para ele. Joe teria de aprender a confiar nela primeiro para lhe contar mais a respeito de sua vida, e talvez nunca chegasse a fazê-lo. 
Ela própria tinha de começar a agir de forma mais madura em relação às circunstâncias, a começar pela mudança para aquela bela casa. Seria apenas imaginação sua, ou Alexius e Andreas tinham conseguido dormir bem mais facilmente depois da mudança? 
— Eu gostaria de lhe agradecer — disse ela, meio sem jeito. 
Ele estreitou os olhos. 
— Pelo quê? 
— Por ter tornado tudo isso possível. Por dar aos meus filhos todo esse espaço. 
— Eles são meus filhos também — disse ele amargamente. — O que você achou que eu ia fazer, Demi? Me manter afastado enquanto você os criava na pobreza? 
Ela decidiu não contestar sua noção de pobreza. 
— Eu realmente não pensei muito sobre isso. Como poderia? Não planejei nada disso. 
Demi fez uma pausa, esperando pela pergunta que ele não fez, mas que ela podia ver estampada em seus olhos. 
— Não, eu não planejei — disse ela fervorosamente. — Mas aconteceu e eu quero fazer o melhor que puder. Quero ser uma ótima mãe e, para mim, isso significa pôr a mão na massa. E por isso que eu não quero uma babá. 
— Mas é coisa demais para você — disse ele asperamente. 
Talvez ele estivesse se baseando na experiência de sua mãe, mas Demi era diferente. Ela balançou a cabeça, respirando fundo. 
— Sei que tenho a sorte de contar com você para me oferecer uma babá, mas eu não quero nenhuma outra mulher se metendo na criação que eu quero dar aos meus filhos. 
— Você não pode administrar uma casa desse tamanho sozinha — insistiu Joe. 
— Tem razão — disse ela, sorrindo hesitantemente, desejando acariciar seu rosto, não de uma maneira sexual, mas sim para aliviar um pouco da dor estampada em sua expressão tão dura. — Você já viu como eu sou bagunceira, portanto talvez fosse melhor empregar o dinheiro contratando uma empregada ou governanta que pudesse manter a casa de acordo com seus padrões. 
Ela o fez parecer alguma espécie de autômato, vivendo num ambiente estéril! Joe teve de sorrir, contudo, ao perceber que, de algum modo improvável, ela havia conseguido fazer as coisas à sua maneira. 
Seu sorriso, porém, logo foi substituído por uma expressão pensativa. Será que ela só estava jogando com ele para rejeitar sua oferta de uma babá? Será que Demi tinha alguma consciência de como os bebês se tornavam apenas belos acessórios no mundo em que ele vivia, vestidos com versões em miniatura da última moda pelas próprias mães, elas mesmas, sempre muito chiques e impecáveis? Talvez ela estivesse querendo impressioná-lo, bancando a mulher que estava realmente disposta a sujar as mãos, ou mesmo tentando fazer com que os meninos ficassem tão apegados a ela a ponto de não quererem se separar dela mais tarde? 
Joe riu. Ele havia se transformado num tremendo cínico. 
— Está bem, Demi. Vamos contratar uma governanta. 




Um comentário:

  1. que maravilhosooooo ❤️
    Joe até que está sendo legal !!
    To adorando tudo...( desculpa não estar comentando em todos os capítulos, e que esses dias está sendo uma correria para mim ) enfim...posta logooo viu,beijos

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Espero que tenham gostado do capítulo :*