Demi não podia reclamar da beleza e do conforto do esconderijo preferido de Joe.
Construído séculos atrás em rocha dourada, o exmosteiro possuía uma vista impressionante dos vales férteis, das escarpas arborizadas e dos lampejos provocantes do mar azul por entre os penhascos.
Também não podia reclamar de Joe pelo seu comportamento, pensou agitada, quando caminhou pelo terraço de pedra sob a tênue luz da alvorada.
Desejava poder fazê-lo.
Teria entendido melhor o que estava se passando pela cabeça dele se ele tivesse feito o esperado e levando-a para a cama logo na primeira noite. Não teria gostado muito — teria gostado demais, corrigiu-se com uma franqueza cruel, enquanto seus pés irrequietos a carregaram até o fim do terraço — mas, pelo menos, entenderia.
O que estava tentando descobrir, sem sucesso, era por que Joelhe cedera acomodações próprias. Aposentos belos e tranqüilos, os quais ele não manifestara nenhuma intenção de visitar. Nos quase quatro dias em que estiveram ali, ele não fizera nada mais alarmante do que tratá-la como uma hóspede. Acompanhara-a nas refeições, durante as quais a conversa a cativara, a contragosto — inteligente, sensata, e às vezes, o que era mais difícil de suportar, fria e dolorosamente impessoal. E tudo isso enquanto parecia olhar através dela, como se não a estivesse enxergando de verdade.
Entre as refeições, ele se recolhia ao gabinete, explicando com cortesia que tinha muito trabalho a fazer, e a deixava à vontade, perdida nos próprios pensamentos.
Suas mãos apertaram a rocha quente do parapeito. Sabia o que o espanhol havia planejado para ela, o que era esperado dela. Então o que ele estava esperando? Por que estava se comportando como um felino selvagem, espreitando a presa a qual ainda não estava faminto o suficiente para devorar, porém tomando cuidado para não perdê-la de vista?
O corpo inteiro estava formigando de tensão sexual, sua mente impaciente, os nervos à flor da pele.
— Nossa, temos um pássaro madrugador! Não conseguiu dormir?
A voz macia, relaxada e inesperada fez com que os cabelos da nuca de Demi se eriçassem, e o coração viesse à boca, pulando que nem um animal encurralado e amedrontado.
Mãos esguias nos seus ombros a viraram de forma a encará-lo. Como sempre, a aparência dele era espetacular, notou com uma tensão febril. Esta manhã estava usando calças de algodão cor de pedra com uma camisa verde oliva para dentro da fina linha da cintura. As feições devastadoramente másculas estavam suaves, mas ao invés de olhar através dela, como de costume, seus olhos escuros ardentes estavam fazendo um inventário lento e minucioso da figura trêmula da moça.
A esta distância ele era dinamite, sempre fora assim. Demi tentou reprimir uma inspiração profunda ao sentir a traição de seus seios rijos por baixo da camisa de flanela quadriculada que estava usando sobre um par de jeans velhos. Os olhos dele no seu corpo pareciam uma carícia física. A carícia que ele lhe estava negando.
Por que mudara de idéia e não queria mais tocá-la?
Ele retirou uma das mãos de seus ombros em resposta à pergunta silenciosa que brilhava nos olhos de Demi, seus longos dedos bronzeados afastaram uma mecha dos cabelos dela do rosto. Ao mesmo tempo, as costas dos dedos lentamente, sedutoramente, acariciavam a sua pele.
Sentia calor por todo o corpo. Um calor abrasador se acumulando entre as suas coxas, fazendo com que as pernas tremessem. Estava tentando manter o rosto tão impassível quanto um pedaço de pedra mas, apesar do esforço, perguntava se ele sabia o efeito que causava nela. Lentamente, Joe abaixou as duas mãos e comentou com suavidade:
— O café da manhã está pronto. Pilar viu que você já tinha se levantado, e achou que pudéssemos preferir tomá-lo no pátio. Vamos.
Com os olhos infelizmente magnetizados pelo comprimento das pernas dele, pelo marchar de aparente indolência com que ele mostrava o caminho, Demi se sentiu a ponto de desmaiar quando se acomodou no seu assento à mesa, no pátio central, protegido a esta hora da manhã do calor do sol, que aumentava rapidamente.
Pombos brancos arrulhavam sonolentos nas árvores que emergiam das rochas mais altas e o perfume da miríade de flores flutuava no ar. Em outras circunstâncias, teria se deleitado com tamanha perfeição.
Como um anfitrião atencioso, Joe serviu-lhe o suco e passou-lhe a travessa de frutas. Demi, selecionando um pêssego, o qual não tinha apetite algum para comer, tentou não gritar.
Se o dia de hoje seguisse o padrão de todos os outros que passara ali, ele conversaria sobre alguma trivialidade enquanto comessem, sugeriria uma caminhada para ela fazer antes que o calor do dia se firmasse, e depois educadamente se desculparia e passaria o tempo todo trancado em seu gabinete.
E ela interpretaria o papel que tinha escolhido para si mesma. Daria de ombros entediada, como se nem estivesse aí, e se questionaria por quanto tempo poderia manter a farsa de total indiferença.
Perguntar a Joe por que estava passando tão pouco tempo com ela estava fora de cogitação. Ele perceberia que ela estava ansiosa pela sua atenção, até mesmo desesperada por ela. A atenção íntima de vinte quatro horas por dia! Não era esse o motivo pelo qual a trouxera para este lugar, pensou, em grande parte justificando o desejo descarado de se jogar nos seus braços, de ter a sua boca enlouquecendo a dela, de...
— Vamos dar um passeio até Marbella, hoje de manhã — Joe comunicou ao abaixar o guardanapo. — Você parece não ter trazido nada além de alguns jeans pesados e camisas.
Um olhar de censura atingiu a palidez suada da face quente de Demi.
— Adequado para fazer as tarefas de final de semana na fria Londres, mas não para este clima.
Ele serviu uma segunda rodada de café ao dizer:
— Vou comprar para você as roupas certas.
Atordoada demais para dizer uma só palavra, devido à intenção dele de passar algum tempo com ela, justamente quando estivera se martirizando com os quatro longos dias em que não parecia inclinado a fazer nada do gênero, Demi esforçou-se para pensar em algo para dizer.
Era isso o começo?
O coração disparou, a respiração fugiu ao controle, a cor tomou conta de suas faces. Obviamente as roupas do dia-a-dia que enfiara tão descuidadamente na mala não o estavam excitando. O que ele tinha em mente? Micro saias, meias arrastão pretas, saltos agulha altíssimos, e tops mínimos de couro ornados com lantejoulas roxas?
Ele praticamente não dissera que a trataria como uma prostituta? Afinal, o título de amante não era bom demais para ela, na sua opinião arrogante? Será que ele esperava que também se vestisse como prostituta?
A idéia era tão absurda que não sabia se ria ou chorava. Em vez disso, apenas olhou fixamente para ele, as faces ficando rosadas, ciente de que estava de queixo caído e boca aberta, mas incapaz de fazer algo a respeito.
Recolocando a xícara de café no pires, Joe levantou-se, notando com um desgosto profundo a expressão prazerosa, de olhos arregalados e boca aberta, no rosto dela.
Ganância.
Fora a primeira emoção genuína que demonstrara desde que chegara ao mosteiro. Parecera irrequieta ou entediada durante seus encontros cuidadosamente dosados. Ele só precisou mencionar comprar algumas roupas novas para que ela se acendesse como uma árvore de Natal. Mas o que mais podia esperar? perguntou-se com implicância, antes de dizer para ela secamente:
— Encontro você no átrio em dez minutos.
Dez minutos para fazer com que seu coração se desacelerasse, para que ela se acalmasse o suficiente para enfrentar o que parecia ser o próximo estágio da brincadeira.
Por que ele estava brincando com ela, enfatizou agitada, enquanto trocava a camisa quadriculada por um suéter de algodão rosado ligeiramente mais atraente e colocava às pressas um batom. O que mais poderia explicar a maneira com que a deixara relativamente em paz, nunca mencionando o motivo verdadeiro dela estar ali, muito menos fazendo algo a respeito.
Hoje pretendia passar algum tempo com ela. Hoje a tocara, as mãos nos ombros dela, o dedo acariciando-lhe a face quando ele afastou o cabelo do rosto. Era óbvio que o segundo estágio do jogo iria começar.
O que não contribuiu para melhorar o ritmo de sua pulsação, reconheceu, enquanto puxava o cabelo para trás até formar um rabo de-cavalo, admitindo que ela também estava fazendo um jogo. Fingir indiferença, até mesmo tédio, era uma boa jogada, mas tinha a sensação de que não conseguiria levar isso adiante por muito mais tempo, pois ele estava se revelando um verdadeiro especialista em deixá-la excitada.
Tal fato era amplamente demonstrado pela facilidade com que ele falava enquanto dirigia, oferecendo a história pouco conhecida do antigo mosteiro, explicando que seu avô comprara a propriedade há vários anos, arrumara alguns especialistas para restaurá-la, e a transformara em uma residência de bom gosto, sem abrir mão da atmosfera exótica.
— Mas meus pais raramente a usam. Consideram o local isolado demais. Se eu não a adorasse, e viesse aqui sempre que posso, e mantivesse um número mínimo de empregados, a propriedade voltaria a ficar em estado lastimável.
Conforme ele falava, as feições se suavizavam, ganhando alegria e vida. Demi engoliu com dificuldade, evitando o calor íntimo do olhar de esguelha que ele lhe lançara.
Capitulo perfeito, amei ❤
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